Autocuidado

Autocuidado

21 de julho de 2021

Nesse período que estamos vivendo fico a pensar sobre a necessidade do autocuidado e faço um convite para refletirmos sobre as questões essenciais da vida.

Uma delas é a impermanência. Sabemos que tudo muda, nada é permanente, mas vivemos numa cultura da eterna juventude e sob o tabu da morte: ninguém deve falar sobre a possibilidade de morrer. Isto causa grandes transtornos.

Anos atrás fui convidada a fazer palestras sobre Tanatologia para estudantes e profissionais da saúde. Eles ficavam incomodados porque quando retornavam para outra visita domiciliar, o paciente tinha falecido. “Mas, como?…”, se perguntavam.

Não estamos preparados para lidar com a morte, nem com quem está prestes a morrer. Na verdade poderemos ir antes deles…

No Evangelho de Tomé traz esta lição: “Somos peregrinos, imigrantes em trânsito, com visto temporário. Durante a nossa permanência em terra estranha, devemos despertar e ativar a nossa consciência cósmica e regressar ‘à alma do Universo’ mais ricos do que dela emigramos.
Sejamos transeuntes!” (Comentário do Evangelho de Tomé – Huberto Rohden).

Tanatologia, do grego “Thanatus”, o Deus da morte, e “logia”, estudo, diz respeito ao estudo científico da morte e do adoecer que leva à morte.

Quem primeiro sistematizou o estudo da Tanatologia no Brasil, foi a psicóloga Wilma Torres. Ela promoveu o I Seminário sobre Psicologia e a Morte, em 1980, no Rio de Janeiro, na Fundação Getúlio Vargas, o que gerou o livro com o mesmo nome.

Pierre Weil, um dos criadores da UNIPAZ, também promoveu cursos sobre o tema e eu participei desses seminários ministrados por ele e também por Gislaine D’Assunção, no curso da Formação Holística de Base. Causava sempre grande impacto nos alunos.

Destacamos os estudos da pesquisadora Elizabeth Kübler-Ross que percebeu as fases por que passam as pessoas quando são diagnosticadas com uma doença que possivelmente levará à morte. Inicialmente vem o choque, em seguida, a negação; quando se tem a certeza de que o diagnóstico é nosso mesmo e é verdadeiro, vem a raiva ou revolta, seguida de barganha ou negociação. Quando se vê que a doença avança, sentimos depressão e, em seguida, a aceitação, com a entrega ao fenômeno natural que é a morte, ou passagem para outro plano diferente do físico e visível.

Atualmente, temos os estudos da doutora Ana Cláudia Arantes sobre os Cuidados Paliativos com os pacientes que se encontram desenganados.

Por que temos tanto medo da morte? Porque temos medo do desconhecido. Não sabemos como será depois da morte. Nossas células clamam por vida e nós também queremos viver muito e intensamente, realizar muitos projetos, aproveitar o convívio com os nossos entes queridos, ver os filhos crescerem, se realizarem, acompanhar o desenvolvimento dos nossos netos…

Há uma lenda egípcia que diz: Quando a pessoa morre é conduzida a um portal onde lhe espera o deus Ozíres que lhe faz duas perguntas. A primeira pergunta é: Você deu alegria a alguém? Se responder afirmativamente ele faz a segunda pergunta: Você tem alegria? Se a resposta for positiva, entrará para um lugar bom no Reino dos Mortos; se não, penará em alguma região de sofrimentos.

Já Emmanuel, que foi o mentor de Chico Xavier, informava: Se quiseres saber para onde vais após a morte, observa o que pensas quando estás sozinho e o que fazes das tuas horas vagas.

Nós, que somos terapeutas e prezamos pelo autocuidado, precisamos encher nossa alma de alegria sob quaisquer situações. Ensinamos às pessoas a se libertarem das cargas pesadas que asfixiam o coração e nós também deveremos prestar atenção ao que pensamos e sentimos quando ninguém nos observa e se preenchemos nosso tempo vazio com coisas que nos fazem crescer.

Nunca vimos tantas pessoas próximas morrendo e diante do cenário triste em nosso país, e no mundo, lembramos de Santa Tereza D’Ávila: “Que nada te perturbe, que nada te apavore. Tudo passa, só Deus fica…”

Tudo são ciclos. Quantas vezes nesta vida nós já morremos e renascemos, qual Fênix, saindo do finito das cinzas para o infinito das novas possibilidades? De repente, as situações mudam, uma viagem surge, aparece um novo marido, ou mulher, conseguimos um novo e melhor emprego… E recomeçamos.

O poeta sufi persa, no poema No meu funeral, publicado na edição deste 2º semestre da Revista Transdisciplinar, pergunta: “Que há de errado com o declínio do sol e da lua? O que te parece declínio, é tão somente alvorada.”

E Victor Hugo, no texto Partida e Chegada, diz: “Quem observa o veleiro sumir na linha do horizonte, certamente exclamará: Já se foi. / …E talvez, no exato instante em que alguém diz: Já se foi, haverá outras vozes, mais além, a afirmar: Lá vem o veleiro.
Assim é a morte.”

Pensar e sentir com naturalidade sobre os ciclos, seus fins e recomeços, nos fará um grande bem. Perguntar: Se fosse a minha vez agora, ou por esses dias, o que precisaria fazer para morrer em paz? E também: Como quero ser e onde quero estar nesse novo ciclo? É possível? Listar as respostas. Desenhar e pintar para fixar na mente essas aspirações.

Quando o Rei Salomão estava no início do seu reinado, sonhou que Iahweh lhe apareceu e perguntou qual o seu desejo. Ele pediu “um coração que escuta para governar o teu povo e para discernir entre o bem e o mal.”

E quando o cego de Jericó se encontrou com Jesus, Aquele que fazia milagres, Ele lhe perguntou: “Que queres que eu te faça?” Poderia pedir qualquer coisa, mas lhe respondeu: “Senhor, que eu torne a ver.”

Como terapeutas, necessitamos de um coração que escuta para sentir o coração do outro com suas demandas, e de um novo olhar, para tornar a ver o que vimos, agora sob uma nova ótica.

Que haja vida nova em nosso interior e que esta vida jorre com abundância para beneficiar a todos.

E, ao nos aproximarmos de alguém que esteja em estágio terminal, desenvolver a compaixão e a tolerância, cuidar com carinho e sabedoria. Essa pessoa talvez esteja desenganada pela medicina humana, não tem mais ilusões. E nós, que vivemos enganados e descuidados da realidade da vida?

Como terapeutas e cuidadores também sentimos cansaço e precisamos ter um tempo para fazer o que gostamos: ler, desenhar, pintar, andar junto à Natureza, respirar com profundidade sentindo a vida plena dentro de nós, fazer silêncio interior… E o silêncio é criativo.

Paramahansa Yogananda diz: “Mantenha no seu íntimo um santuário secreto de silêncio, onde não será permitida a entrada das oscilações de humor, das aflições, das lutas ou da desarmonia. Todos os sentimentos de ódio, vingança e desejos em geral, devem ser deixados do lado de fora. Neste refúgio de paz, Deus lhe visitará.”

Nesse estado de meditação o nosso cérebro entra numa freqüência mais intensa de sincronização, atingindo as ondas Gama (mais de 40Hz), que dá uma sensação de unidade com tudo e com todos. Atingimos assim o numinoso do qual se refere Jung, um estágio de expansão da consciência que nos leva ao contato com o que há de mais sublime em nós mesmos, marcando a nossa vida e nos levando à mudanças.

Só quando experimentamos em nós mesmos essas vivências é que poderemos tocar o coração dos outros. E sentir que nos amamos, profundamente nos amamos.

AUTOCUIDADO – Palestra proferida no evento III FÊNIX LUX PAN 2021(19 a 24/07/2021), no dia 21/07/2021, eixo temático Cuidado, Prevenção e Promoção à Saúde.
* Celeste Carneiro é arteterapeuta junguiana e transpessoal (ASBART 0035/0906 – Instituto Junguiano da Bahia – IJBA/ Escola Bahiana de Medicina). Especialista em psicologia transpessoal (ALUBRAT 201740 – Instituto Hólon – BA / Escola Bahiana de Medicina e Phoenix / Universidade Federal de Sergipe). Formada em Artes Plásticas (SP). Escritora, professora, supervisora, editora e palestrante. Membro do Colégio Internacional dos Terapeutas – CIT. Conselheira de Honra da UBAAT (União Brasileira das Associações de Arteterapia). Editora da Revista Transdisciplinar. Membro da ATI – Asociación Transpersonal Iberoamericana. 55 71 98874-1155 (zap) cel5zen@gmail.com www.artezen.org www.revistatransdisciplinar.com.br
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